sábado, 25 de dezembro de 2010

DEFESA OU ATAQUE???

Já meu velho avô dizia: “Prefiro mexer (ou seja, tratar, conviver) com mil cabeças de boi a mexer com o bicho homem”. Na época eu não compreendia aquele provérbio, mas hoje posso dizer que concordo com ele em gênero, número e grau. Como é difícil a arte de se relacionar enquanto humanos! Todo e qualquer relacionamento a princípio tem por base apenas a superficialidade do encontro inusitado ou não, que se aprimora com o passar do tempo, e em todo começo cria-se uma postura camuflada daquilo que verdadeiramente é fiel e corresponde ao real do que somos. Quando não existe intimidade, a formalidade é o meio mais leal e eficaz que temos para usufruir, pois estamos nos embrenhando em território não muito conhecido e tememos as discordâncias, evitamos desentendimentos que possam abalar o convívio, muitas vezes nos fazemos imparciais para não criar maiores atritos; e assim somos infiéis conosco e com o que há de mais autêntico em nós. Isso não se aplica apenas em casos esporádicos; é unânime quando se trata do conhecer, desmistificar ou conviver com alguém o qual pouco sabemos. Não defino isso como falta de personalidade, menos ainda de falsidade; vejo que simplesmente é um instinto natural e humano que se manifesta tão somente como defesa para que se perpetue a harmonia. A questão é um tanto quanto delicada, até por que quanto mais intensa fica essa relação, mais conhecemos as vulnerabilidades, fraquezas e pontos fortes do outro, (algo bem normal nos relacionamentos conjugais), e essa intimidade faz-nos correr o risco de converter este instrumento em destruição, quando mal utilizado. Cria-se outro dilema: ao mesmo tempo que é agradável cultivar a proximidade, pode ocorrer de ambas as partes se ferirem mutuamente quando acontecer alguma alteração emocional, e em conseqüência disso, muitas pessoas se isolam evitando toda e qualquer chateação que toda intimidade acomete, então se fecham como conchas, perdendo muito; ou quem sabe cientes de que realmente é a opção correta e os fará mais felizes, talvez seja o real desejo de seus corações; não percebem que se escondem por trás do temor de viver abertamente e igualmente a todos que arriscam ser eles mesmos e dão oportunidades para que os outros a sua volta também o façam, simultaneamente se dão uma chance de descobrir o que na maioria das vezes são apenas suposições e compreensão hipotética. Lidar com a intimidade exige sabedoria. O importante é saber e tentar comunicar as próprias insatisfações claramente e sem agredir o outro, o que é muito comum; não dizem que a melhor arma de defesa é o ataque? Parece que isso é regra geral. É essencial que tenhamos um ouvido emocional, e isso não se trata meramente escutar uma idéia, ler ou tentar entender os argumentos a respeito da mesma; vai mais fundo e além; designa esforço por compreender como o outro se sente durante uma avalanche de emoções ou situações, onde o mesmo carrega suas próprias impressões a respeito de algo, suas próprias interpretações, ainda que deturpadas ou codificadas no antônimo do que realmente expressa o contexto, tom ou gestos. Quero compartilhar uma frase que friso muito para meus filhos: ‘A dor do outro deve ser também a minha dor’, isto é, se colocar no oposto de sua posição, trocar os lados e refletir a respeito do que faríamos se estivéssemos no lugar do outro; dessa forma a intimidade se torna aliada, pois a compreensão e tolerância entram em atividade. A sintonia entre as pessoas, ou mesmo a discordância saudável e clara é o que revela a qualidade e dimensão de um relacionamento, seja ele qual for. São itens que fortalecem os laços e nos torna seres acessíveis, pois se nos fechamos demais, corremos o risco de causar temor nos outros, logo, inacessíveis. Nossas emoções, indistintamente, são meio que incontroladas e nem sempre bem colocadas em palavras ou decodificações. Se expressam em nosso timbre de voz, expressões faciais, gestos, movimentos aleatórios e involuntários que em determinados meios inexiste uma forma clara de se desvendar, apenas em um corpo a corpo, olhos nos olhos serão fielmente interpretadas até por pessoas que se conhecem bem, que teem uma intimidade pra lá de aguçada. Isso se traduz nos diálogos onde demonstramos fielmente nossos sentimentos através de como nos expressamos. Muitas vezes não sabemos como expor nossas frustrações e não raras vezes nos deixamos levar por achismos, que nos leva à ira e logo após ao ataque. Tal estigma só enfatiza que somos iguais, só mudamos os endereços. Isso não significa que temos que evitá-las ou programá-las, mas expressá-las com cautela e com o máximo de serenidade que conseguirmos. Estados de espírito são passíveis de transferência; devemos sim tentar não exagerar ao falar de nossas dores e dilemas, também nunca ocultar aquilo que queremos transmitir, mas sempre dando o tom emocional certo ao que é dito e escutado; algo como um eufemismo que é real, mas explícito de forma amena. Concluindo, não somos treinados para lidar com nossas emoções e quem nos dera poder adivinhar a emoção dos outros?! O ideal seria associar nosso aprendizado e experiência de vida, que cresce e é mutável gradativamente, para tentar compreender e atuar em benefício da vida em comum, para isso vale a pena todos os recursos: a razão, a franqueza e transparência, a intuição, a sinceridade, a emoção e principalmente a compaixão. Sobretudo nos colocar sempre na pele do outro e mesmo com esforço incomum perceber que somos seres únicos; mas com reações e emoções quase que completamente iguais, e a convivência ideal nada mais é que a junção da intimidade que extrapola e liberta, versus contradições essenciais e normais naquilo que os outros discordam em nós e vice-versa. Somos seres distintos diferenciados pelas polêmicas, momentos e áreas difíceis de nossas vidas, mas dotados dos mesmos sentimentos que cada um de nossos percalços produz. Enfim, se ‘A dor do outro deve ser também a minha dor’, espero de coração que os outros também compactuem desse mesmo pensamento para que pensem no outro assim e em contrapartida o mesmo possa refletir que: ‘A minha dor também deve ser a dor do outro’.

By Cris

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